quarta-feira, 14 de dezembro de 2016

O Hábito De Ler - Por Iram Saraiva / Antonio Cabral Filho - RJ


O Hábito De Ler - Por Iram Saraiva*
O costume de ler o brasileiro não tem. Por isso, quase nada vê, pouco ouve, e fala com uma dificuldade espantosa.
Não vejo outra razão, que não seja a falta de leitura, para tanta servilidade de uma nação inteira. É a própria ausência de dignidade ante aqueles de quem se depende.
Aqui, Executivo, Legislativo e Judiciário não são poderes. São patrões. Lamentável constatação que, com certeza, deixaria triste Montesquieu, o idealizador da divisão dos poderes, na mesma proporção vivida por Santos Dumont ao ver a sua criação, o avião, usada na ordem inversa do que sonhava, qual seja, a paz.
O que o hábito de ler poder fazer ao homem?
No primeiro momento, abre a possibilidade de visão pessoal, o que equivale dizer, enxergar o mundo da forma que ele é, e não do jeito que contam que é.
Depois, ensina ouvir conforme alguém expressou e não na intenção distorcida com a qual, muitas vezes, as palavras são usadas.
Finalmente, afasta o bloqueio do não saber e de se manifestar sem conteúdo e reflexão.
De posse desses três requisitos não há quem não aprenda a pensar, fato que evita que aconteça a previsão de Montesquieu: “Quanto menos os homens pensam, mais eles falam”.
Mas também não conheço um homem sequer que consiga raciocinar sem ter o hábito de ler. Sem conhecimento o cérebro é um moinho que apenas tritura o vazio.
Quem não lê não tem ideias ou convicções, porque o seu alcance só vai até o limite que a ignorância permite: nada.
Há sempre um livro pronto para nos ensinar. A questão é que ele é esquecido em cima de um móvel qualquer todo coberto de poeira.
Fossemos um povo letrado aquele que nos governa, por força do hábito, também o seria, e erraria menos. Nação culta não aceita ser conduzida como o gado é levado ao matadouro.
Já vi inúmeras passeatas, o mesmo tanto de protestos, milhares de faixas “Fora” isso ou aquilo nos finais de semana, e, na segunda-feira, segue a vida normalmente como se nada houvesse acontecido. Ou melhor, quando não piora um pouquinho mais. É muita resignação para o meu gosto.
Às vezes, penso que as redes sociais funcionam, para os seus usuários, como vingança suficiente contra os fatos e seus ocasionadores, pois bastam charges, piadinhas, fotos denunciativas para acalmar a fúria quase santa da galera que também participou dos protestos de rua.
Meu amigo, poderes não temem passeatas e nem charges. Governo morre de medo é de povo culto, que lê e sabe dos seus direitos originários. Portanto, vamos ler, com o propósito de saber, que, talvez, daqui cinco décadas essa gente seja varrida da nossa história.

(Iram Saraiva, ministro emérito do Tribunal de Contas da União, )https://impresso.dm.com.br/edicao/20161214/pagina/19/conteudo/opiniao/2016/12/o-habito-de-ler.html )

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